terça-feira, 28 de setembro de 2010

Um dia

Estreita e abandonada, numa ruela
emoldurada por esquinas
de muros altos, sujos e rugosos,
exceto por um ônibus
imóvel, à margem
do tráfego que inexistia.
Este, um ônibus que repousa
- elefante que dorme - protegido do Sol
sobre o musgo que brota
por entre paralelepípedos
cobrindo de tempo suas faces
sobre outras faces desbastadas
num lento lance de dados
a beijar o chão, pó de pedra.
Abaixo dos tons de poeira,
ruídos inaudíveis desenhavam nas
ondulações da superfície
formas de ondas que se percebem
mesmo à transparência de um rio
mais plácido, apenas vindos da avenida
onde se dá o corte de seu sentido
como, um dia, a caminho de São Paulo.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Santos

Neste terraço mediocremente confortável,
bebemos cerveja e olhamos o mar.
Sabemos que nada nos acontecerá.

O edifício é sólido e o mundo também.

Sabemos que cada edifício abriga mil corpos
labutando em mil compartimentos iguais.
Às vezes, alguns se inserem fatigados no elevador
e vem cá em cima respirar a brisa do oceano,
o que é privilégio dos edifícios.

O mundo é mesmo de cimento armado.

Certamente, se houvesse um cruzador louco,
fundeado na baía em frente da cidade,
a vida seria incerta... improvável...
Mas nas águas tranqüilas só há marinheiros fiéis.
Como a esquadra é cordial!

Podemos beber honradamente nossa cerveja.




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em Sentimento do Mundo (1940), C.D.A

ps: mentira. O poema se chama "Privilégio do Mar".